Pesquisar este blog

Total de visualizações de página

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A trágica vinda de Benny Hinn ao Brasil



Por Márcio Jones

Diante de alguma controvérsia doutrinária ou evento de questionável índole, o puritano John Owen (1616-1683) possuía um método solucionador interessante, o qual quero apresentar. Owen nunca tratou um problema direta e imediatamente; sempre o colocou em seu contexto. Além disso, não se precipitava em responder a perguntas suscitadas. Antes, perguntava: “que princípio está aqui envolvido”? Em seguida: “onde isto se encaixa na doutrina e no ensino geral da Bíblia?”. Vejo tal postura como muito equilibrada, que se distancia, principalmente, de análises equivocadas por falta de conhecimento e que diplomaticamente se adequa até mesmo à mais acirrada discussão teológica. Afinal, se nos dizemos cristãos, sobretudo reformados, invocamos como única regra de fé e prática a Sagrada Escritura, e, para solucionarmos dúvidas teológicas, devemos nos dirigir a Ela em última instância, e as paixões e partidarismos que fiquem em segundo plano.

Partindo desse pressuposto, quero tecer alguns comentários sobre a recente vinda do sr. Benny Hinn ao Brasil, sobretudo à Taguantinga-DF — cidade onde moro , e as reuniões por ele lideradas, em geral, rotuladas de “cultos de avivamento”. Entendo que é de suma importância ao se estudar determinado instituto doutrinário identificarmos aquilo que não está contido em seu conceito. Ou seja, para que compreendamos o que vem a ser um avivamento, necessário é sabermos o que não é um avivamento. Para tanto, convém que tratemos um pouco sobre o ministério de um homem chamado Charles Finney. 

No século XIX, avivamento passou a ser um assunto de grande relevância, a partir do ministério do pastor Charles Finney, então presbiteriano, mais conhecido por suas técnicas do que por sua teologia nada ortodoxa. Antes dele, tais manifestações eram tidas como soberanas, graciosas e inesperadas, provenientes de Deus. Finney, porém, após narrar uma experiência marcante com o Espírito Santo, passou a compreender que avivamento espiritual nada mais é do que o emprego de determinadas leis espirituais. Ele o comparou à semeadura. Pensava que da mesma maneira com que se cultiva uma semente, no campo espiritual, se houver rigorosa observância aos métodos corretos o avivamento é possível de ser fabricado. É dizer, se o povo de Deus se arrepender de seus pecados e os confessar, buscar a Deus em oração, o avivamento virá.

Finney, então, começou a colocar tais métodos em prática. Ele costumava visitar cidades onde havia igrejas presbiterianas ou não, nas quais fazia reuniões de uma semana, pregando contra o pecado e a necessidade de as pessoas se arrependerem de seus pecados e se humilharem diante de Deus. Com efeito, ele narra, e outros também, resultados extraordinários, como quebrantamento, cidades inteiras mudadas pelo Espírito Santo mediante. Finney então inaugura um tipo de ministério que não havia antes na igreja, que é o do ‘avivalista’, um pastor especialista em produzir avivamentos.

Em sentido contrário, à luz da Escritura notamos que avivamento não é uma ciência, como afirmava Finney, mas um dom da graça da parte de Deus, impossível de ser produzido mediante a aplicação de determinados métodos. Segundo Franklin Ferreira, avivamento é “a ação soberana do Espírito Santo, agindo de tal forma que grande número de pessoas receba o evangelho ao mesmo tempo, enquanto a igreja abandona seus pecados”. Avivamento bíblico é, sim, um retorno às Escrituras, um retorno aos preceitos divinos, abandono dos ídolos. Algumas porções bíblicas consensuais entre os teólogos atestam esse posicionamento, por exemplo: Gn 35.1-15; 2 Rs 18.1 ; 2 Cr 14 e 15; 2 Cr 26; 2 Cr 34; Ne 8, 9.

Hoje, os expedientes adotados por Benny Hinn e os rótulos de suas reuniões, nos fazem lembrar, de imediato, de Charles Finney. Como no tempo de Finney, os cristãos da atualidade perguntam: “o que importa sua doutrina, se em tudo que Benny faz há grandes resultados, grandes manifestações de Deus?”. “Ora, tudo isso é, sim, o agir do Espírito Santo!”. Vigora o pensamento pragmático, de “aparentes” resultados, de grande concentração de pessoas, de comoção e histeria coletivas, desprezado o mínimo exame bíblico.

O que pensar de um homem que abertamente diz que Deus não o permite pregar (aos 10m50s do vídeo abaixo) — sem mencionar seus outros ensinos heréticos, veja aqui , por exemplo? Ora, se é a pregação o método por intermédio do qual Deus chama seus eleitos (Mc 1:38, Rm 10.14; 1 Co 1.21) e edifica a fé destes (Rm 10.17), como posso abraçar tal declaração como se viesse do próprio Deus?! O ministério de homens como Pedro, Paulo, Apolo estavam solidamente edificados sobre a pregação do evangelho. Vejamos Paulo, que de cidade em cidade anunciava o evangelho (At 13.16-41; At 14.1-7; At 16.13,14; At 17.10-31; At 18.5-11), procurando persuadir os seus ouvintes (2 Co 5.11). O escritor aos Hebreus afirma que "nestes últimos dias, nos falou Deus pelo Filho" (Hb 1.2). Cristo é a própria Palavra inegavelmente (Jo 1.1), sem mais revelações posteriores. E o trabalho do Espírito Santo, tão mencionado pelo pastor em comento, é glorificar a Cristo (Jo 16.14), dando-Lhe testemunho (Jo 15.26). Seria no mínimo ilógico glorificar a Jesus sem pregar o próprio Jesus, que é a Palavra.

Não bastasse isso, há um convite despudorado a um cristianismo místico e esotérico que privilegia a experiência em detrimento da Escritura, como induz o referido pastor. Devemos provar os espíritos (1 Jo 4.1). E qual é o critério? Invariavelmente a Escritura, cujo conhecimento liberta (Jo 8.32). A nobre virtude dos cristãos de Bereia residia em seu hábito de não receber cegamente tudo quanto ouviam de um "avivalista" qualquer, mas em analisar avidamente as Escrituras a fim de comparar o conteúdo de um sermão com aquilo que estava escrito (At 17.11). Portanto, a experiência deve se conformar à Escritura, e não o contrário. Se assim não fosse, qual seria o critério para validar uma experiência anterior com uma posterior? E quando a comparação se der entre a experiência de um cristão e a de um budista ou de um hinduísta? Voltamos à mesma proposição: a baliza é a Escritura, a verdade que liberta, santifica e pavimenta a nossa comunhão com Deus. A fé cristã é essencialmente racional. Citando John Stott, "crer é também pensar".

            Sola Scriptura.


Nenhum comentário:

Postar um comentário